quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

VIVER NA CONSCIÊNCIA DE PERTENCER A DEUS

Missa da Apresentação do Senhor. Palavra de Deus: Malaquias 3,1-4; Hebreus 2,14-18; Lucas 2,22-40.

          A vida foi concedida a cada um de nós como um dom, um presente de Deus, e nós podemos vivê-la de duas maneiras: nos apossando dela de maneira egoísta, ou fazendo dela uma doação de nós mesmos a Deus e aos outros.
     A atitude de Maria e José, de irem ao templo e apresentarem/consagrarem o filho a Deus, revela essa consciência: tudo o que eu tenho e tudo o que eu sou é um dom de Deus para mim. E eu quero livremente dedicar, consagrar a Deus e aos irmãos tudo o que tenho e tudo o que sou. Essa foi também a atitude de Ana, que ao se tornar mãe de Samuel, foi ao templo e apresentou o filho a Deus, dizendo: “Eu o dedico ao Senhor por todos os dias que viver” (1Sm 1,28).
            Muitos pais, logo que seus filhos nascem, procuram a Igreja para batizá-los. Fazem isso movidos por superstição, por medo de que seus filhos fiquem doentes, ou porque desejam que seus filhos cresçam, desde pequenos, na graça de Deus? Quantos pais, depois de terem batizado seus filhos, deixam de dedicá-los a Deus, deixam de educá-los no caminho da fé nos demais dias de suas vidas? Por outro lado, a apresentação do menino Jesus no templo convida a nossa Igreja a entender o Batismo como a primeira porta que precisa estar aberta para acolher as famílias que nos procuram para consagrar seus filhos a Deus (cf. A Alegria do Evangelho, n.47).
            Jesus tinha quarenta dias de vida, quando foi consagrado a Deus. E sabemos que ele viveu toda a sua vida procurando fazer a vontade de Deus (cf. Mt 12,48-50; 26,36-46; Hb 10,5-7). Se estamos aqui, diante dessa cena da Apresentação do Senhor, não é para olharmos para o nosso passado e recordar quando – e se – fomos consagrados a Deus por nossos pais, mas olhar para o nosso presente e nos perguntar: Eu vivo como uma pessoa que pertence a Deus? Eu procuro livremente me consagrar a Deus com meus pensamentos e sentimentos, com meus desejos, minha vontade e minha liberdade? Eu desejo ser de Deus?   
            Da mesma forma como as portas do templo se abriram para receber Jesus, trazido nos braços de Maria e de José, o salmista nos convida a abrir as portas do templo da nossa consciência e do nosso coração para que o Senhor possa entrar: “Ó portas, levantai vossos frontões! Elevai-vos bem mais alto, antigas portas, a fim de que o rei da glória possa entrar!” (Sl 24,7). E, segundo o profeta Malaquias, este Senhor que entra em nosso templo vem fazer uma purificação em nós: Ele vem para “derreter e purificar a prata” (Ml 3,3). Até quando a prata precisa ficar exposta ao fogo para se purificar? Até que aquele que a purifica veja o seu próprio rosto refletido nela...
          A imagem do fogo que derrete e purifica a prata é uma linguagem bíblica para falar das tantas provações que passamos na vida. Neste sentido, a carta aos Hebreus nos lembra que Jesus participou da mesma condição nossa, para “libertar os que, por medo da morte, estavam a vida toda sujeitos à escravidão... (Ele) não veio ocupar-se com os anjos, mas com a descendência de Abraão (os seres humanos)... Tendo ele próprio sofrido ao ser tentado, é capaz de socorrer os que agora sofrem a tentação” (Hb 2,14.15.16.18). Até quando ficamos expostos à provação? Até recuperarmos a nossa verdadeira imagem de pessoas que pertencem ao Senhor e não ao mundo.  
            No momento em que Jesus é apresentado no templo, dois idosos estão ali. É bonito perceber que Simeão e Ana envelheceram, mas não perderam a fé e a esperança em Deus. Quantos de nós, mesmo ainda jovens, ou relativamente jovens, já estamos envelhecidos, ou, quem sabe, mortos? Cora Coralina disse, certa vez: “Sei que alguém vai ter que me enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo”... Para a nossa geração, habituada com o imediatismo e com a rapidez, Simeão e Ana nos lembram que precisamos aprender a suportar e a lidar com as desolações da vida, até que o Senhor nos visite com a sua consolação; precisamos aprender a acolher e a aceitar o lento processo do nosso crescimento, do nosso amadurecimento, da nossa santificação e da transformação da realidade à nossa volta.
     Uma palavra final. Simeão disse a Maria: “Este menino vai ser causa de queda e de reerguimento para muitos...” (Lc 2,34). Embora Jesus tenha vindo como “luz para iluminar as nações” (Lc 2,32), sua luz será acolhida por uns, mas rejeitada por outros. Por isso Jesus sempre “será um sinal de contradição” (Lc 2,34): Ele revelará o que há no mais íntimo de cada ser humano; Ele nos ajudará a enxergar o que em nós é coerente e incoerente, verdade e mentira, abertura e fechamento à vontade de Deus.
            Nesta celebração, levantemos os frontões das nossas portas, para que o Senhor possa entrar e tomar posse do templo que devemos ser para Ele. Retomemos o nosso ideal de viver como pessoas que pertencem verdadeiramente a Deus. Deixemo-nos purificar pelo fogo da sua Palavra. Tornemo-nos portadores da sua luz e da sua consolação para as outras pessoas, ainda que tenhamos que ser também para elas um sinal de contradição...    
                                        
                                                          Pe. Paulo Cezar Mazzi

Um comentário:

  1. É perigosa ilusão viver-se preocupado em trocar o verbo ser pelo ter. Ser é essencial. Ter é acidental. Preocupe-se em ser bom, justo, com o "agora" da sua vida, é o único que lhe pertence; viva-o com a dignidade de Deus de acordo com a sua consciência, em conformidade com tudo aquilo que vc aprendeu na sua igreja e no seu lar. Praticar o bem, amar ao seu irmão e amealhar maiores méritos para a conta-corrente da sua vida. Procure ser verdadeiro, assim a verdade é única, porque a luz que ela reflete em vários ângulos é uma só - Deus. Evite a acomodação que o afasta de servir aos outros . Muitas vezes vc tem a grande oportunidade de repartir todo esse imenso potencial de bem que armazena em seu coração; e com tempo para dar, com amor para repartir, com vontade de ajudar, porque está aí esperando?... Vá pela vida espalhar esperança, alegria, amor, a recompensa virá depois.

    ResponderExcluir