Missa da Apresentação do Senhor. Palavra de Deus: Malaquias
3,1-4; Hebreus 2,14-18; Lucas 2,22-40.
A vida
foi concedida a cada um de nós como um dom, um presente de Deus, e nós podemos
vivê-la de duas maneiras: nos apossando dela de maneira egoísta, ou fazendo
dela uma doação de nós mesmos a Deus e aos outros.
A
atitude de Maria e José, de irem ao templo e apresentarem/consagrarem o filho a
Deus, revela essa consciência: tudo o que eu tenho e tudo o que eu sou é um dom
de Deus para mim. E eu quero livremente dedicar, consagrar a Deus e aos irmãos tudo
o que tenho e tudo o que sou. Essa foi também a atitude de Ana, que ao se
tornar mãe de Samuel, foi ao templo e apresentou o filho a Deus, dizendo: “Eu o
dedico ao Senhor por todos os dias que viver” (1Sm 1,28).
Muitos
pais, logo que seus filhos nascem, procuram a Igreja para batizá-los. Fazem isso
movidos por superstição, por medo de que seus filhos fiquem doentes, ou porque
desejam que seus filhos cresçam, desde pequenos, na graça de Deus? Quantos
pais, depois de terem batizado seus filhos, deixam de dedicá-los a Deus, deixam
de educá-los no caminho da fé nos demais dias de suas vidas? Por outro lado, a apresentação
do menino Jesus no templo convida a nossa Igreja a entender o Batismo como a primeira porta que precisa estar aberta para acolher as famílias
que nos procuram para consagrar seus filhos a Deus (cf. A Alegria do Evangelho,
n.47).
Jesus
tinha quarenta dias de vida, quando foi consagrado a Deus. E sabemos que ele
viveu toda a sua vida procurando fazer a vontade de Deus (cf. Mt 12,48-50; 26,36-46;
Hb 10,5-7). Se estamos aqui, diante dessa cena da Apresentação do Senhor, não é
para olharmos para o nosso passado e recordar quando – e se – fomos consagrados
a Deus por nossos pais, mas olhar para o nosso presente e nos perguntar: Eu vivo como uma pessoa que pertence a Deus?
Eu procuro livremente me consagrar a Deus com meus pensamentos e sentimentos,
com meus desejos, minha vontade e minha liberdade? Eu desejo ser de Deus?
Da mesma
forma como as portas do templo se abriram para receber Jesus, trazido nos
braços de Maria e de José, o salmista nos convida a abrir as portas do templo
da nossa consciência e do nosso coração para que o Senhor possa entrar: “Ó
portas, levantai vossos frontões! Elevai-vos bem mais alto, antigas portas, a
fim de que o rei da glória possa entrar!” (Sl 24,7). E, segundo o profeta Malaquias,
este Senhor que entra em nosso templo vem fazer uma purificação em nós: Ele vem
para “derreter e purificar a prata” (Ml 3,3). Até quando a prata precisa ficar
exposta ao fogo para se purificar? Até que aquele que a purifica veja o seu próprio
rosto refletido nela...
A imagem
do fogo que derrete e purifica a prata é uma linguagem bíblica para falar das
tantas provações que passamos na vida. Neste sentido, a carta aos Hebreus nos
lembra que Jesus participou da mesma condição nossa, para “libertar os que, por
medo da morte, estavam a vida toda sujeitos à escravidão... (Ele) não veio
ocupar-se com os anjos, mas com a descendência de Abraão (os seres humanos)...
Tendo ele próprio sofrido ao ser tentado, é capaz de socorrer os que agora
sofrem a tentação” (Hb 2,14.15.16.18). Até quando ficamos expostos à provação?
Até recuperarmos a nossa verdadeira imagem de pessoas que pertencem ao Senhor e
não ao mundo.
No
momento em que Jesus é apresentado no templo, dois idosos estão ali. É bonito
perceber que Simeão e Ana envelheceram, mas não perderam a fé e a esperança em
Deus. Quantos de nós, mesmo ainda jovens, ou relativamente jovens, já estamos envelhecidos,
ou, quem sabe, mortos? Cora Coralina disse, certa vez: “Sei que alguém vai ter
que me enterrar, mas eu não vou fazer isso comigo”... Para a nossa geração,
habituada com o imediatismo e com a rapidez, Simeão e Ana nos lembram que
precisamos aprender a suportar e a lidar com as desolações da vida, até que o
Senhor nos visite com a sua consolação; precisamos aprender a acolher e a
aceitar o lento processo do nosso crescimento, do nosso amadurecimento, da
nossa santificação e da transformação da realidade à nossa volta.
Uma palavra
final. Simeão disse a Maria: “Este menino vai ser causa de queda e de reerguimento
para muitos...” (Lc 2,34). Embora Jesus tenha vindo como “luz para iluminar as
nações” (Lc 2,32), sua luz será acolhida por uns, mas rejeitada por outros. Por
isso Jesus sempre “será um sinal de contradição” (Lc 2,34): Ele revelará o que há
no mais íntimo de cada ser humano; Ele nos ajudará a enxergar o que em nós é coerente
e incoerente, verdade e mentira, abertura e fechamento à vontade de Deus.
Nesta celebração, levantemos os frontões das nossas portas, para que o Senhor possa entrar e tomar posse do templo que devemos ser para Ele. Retomemos o nosso ideal de viver como pessoas que pertencem verdadeiramente a Deus. Deixemo-nos purificar pelo fogo da sua Palavra. Tornemo-nos portadores da sua luz e da sua consolação para as outras pessoas, ainda que tenhamos que ser também para elas um sinal de contradição...
Nesta celebração, levantemos os frontões das nossas portas, para que o Senhor possa entrar e tomar posse do templo que devemos ser para Ele. Retomemos o nosso ideal de viver como pessoas que pertencem verdadeiramente a Deus. Deixemo-nos purificar pelo fogo da sua Palavra. Tornemo-nos portadores da sua luz e da sua consolação para as outras pessoas, ainda que tenhamos que ser também para elas um sinal de contradição...
Pe. Paulo Cezar Mazzi