quinta-feira, 21 de novembro de 2019

NOSSA FONTE, FUNDAMENTO, CONSISTÊNCIA E META FINAL


Missa de Cristo Rei do Universo. Palavra de Deus: 2Samuel 5,1-3; Colossenses 1,12-20; Lucas 23,35-43.

A figura de um rei tem quase nada a dizer ao nosso mundo moderno, mas no mundo bíblico ela se reveste de uma grande importância. O rei é o defensor do seu povo; é aquele que vai à frente do exército para lutar e proteger o seu povo. Neste sentido, ele é o promotor da paz. Além disso, o rei é responsável por garantir a justiça e o direito, o que significa não permitir que no seu reino haja injustiças que levem pessoas inocentes a sofrerem e a morrerem. Enfim, como nos ensina o Salmo 72, o rei é o defensor dos mais fracos: só ele pode salvar a vida dos indigentes, esmagar os opressores, libertar os prisioneiros e ter compaixão dos fracos. Este sentido bíblico da figura do rei deve iluminar a nossa celebração de hoje, dia em que a Igreja proclama Jesus Cristo, Rei do universo.  
Pode parecer muita pretensão nossa afirmar que Jesus Cristo é Rei “do universo”, uma vez que nós, cristãos, somos apenas um terço da humanidade. Por isso, precisamos entender essa verdade a respeito de Jesus a partir da Sagrada Escritura, quando o apóstolo Paulo afirma: “Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele existe antes de todas as coisas, e todas têm nele a sua consistência” (Cl 1,16-17). Em relação ao mundo, em relação a tudo o que foi criado, Jesus Cristo desempenha o papel de fonte, fundamento, consistência e meta final. Portanto, só em Jesus Cristo é que nós encontramos a razão de ser da nossa existência, pois nele o Pai nos escolheu antes da criação do mundo (cf. Ef 1,4). Quando Jesus Cristo não ocupa o centro da nossa existência, perdemos o nosso fundamento, como uma construção que, por perder seu próprio alicerce, desaba. Nele ainda está também a nossa consistência, o nosso humano curado, redimido, integrado. Por fim, Ele é a nossa meta final, que é a comunhão definitiva com o Pai.
Apesar dessa verdade profunda da nossa fé, não apenas a maior parte da humanidade desconhece Jesus Cristo como muitos de nós, que supostamente já O conhecemos, não vivemos sob o seu domínio salvífico, no sentido de que não nos submetemos à sua verdade, não pautamos a nossa conduta segundo o seu Evangelho e não aceitamos sua “interferência” em diversos âmbitos da nossa vida. Quando muito, Jesus se tornou para não poucos cristãos, apenas um pronto-socorro nas horas críticas da vida. Portanto, há uma distância muito grande entre a declaração de que Jesus Cristo é rei do universo e o fato de que muitos cristãos não aceitam viver sob o domínio desse rei, sofrendo, em contrapartida, a dominação imposta pelo maligno ou por um mundo especializado em guiar cegos para o mesmo buraco em que ele se encontra.
A boa notícia é que todos nós, seres humanos, podemos dizer em relação a Jesus Cristo o que todas as tribos de Israel disseram em relação ao rei Davi: “Aqui estamos. Somos teus ossos e tua carne” (2Sm 5,1). Sendo verdadeiro Deus e verdadeiro homem, Jesus Cristo assumiu em tudo a nossa condição humana, sofrendo ele mesmo nossas fraquezas e escolhendo livremente se submeter ao Pai, para nos livrar do círculo vicioso da desobediência que nos leva para a destruição e a morte. É por isso que Paulo afirma: “Deus quis habitar nele com toda a sua plenitude e por ele reconciliar consigo todos os seres, os que estão na terra e os que estão no céu, realizando a paz pelo sangue da sua cruz” (Cl 1,19-20).  
Da mesma forma como todas as coisas foram afetadas pelo pecado e pela morte, a partir das pessoas que se deixaram dominar pelo mal, Deus Pai confiou ao seu Filho o poder de restaurar todas as coisas, reconciliando-as com sua própria verdade, devolvendo a cada uma delas o seu próprio fundamento e a sua consistência, realizando a paz pelo sangue da cruz de seu Filho. Desse modo, toda pessoa que escolhe livremente colocar-se sob o domínio espiritual de Cristo é como um enfermo que se deixa curar, um perdido que se deixa encontrar, um coração conflito que se deixa pacificar ou um condenado que se deixa absolver e salvar.
Eis, portanto, a cena central do Evangelho de hoje: dois homens estão condenados, junto com Jesus, à morte de cruz. Enquanto um deles ridiculariza o senhorio de Jesus, dizendo: “Tu não és o Cristo? Salva-te a ti mesmo e a nós!” (Lc 23,39), o outro reconhece tanto a necessidade de ambos serem salvos como também Aquele que é o único que tem o poder de realizar tal salvação: “Jesus, lembra-te de mim quando entrares no teu reinado” (Lc 23,42), ao que Jesus lhe respondeu: “Em verdade eu te digo, ainda hoje estarás comigo no paraíso” (Lc 23,43).
Essas palavras de Jesus revelam o verdadeiro sentido do seu reinado, do seu domínio salvífico sobre todo ser humano que escolhe livremente se submeter a ele: este Rei nos abre o caminho de volta ao paraíso, devolvendo-nos o estado psíquico e espiritual de pessoas reconciliadas, pacificadas pelo sangue de sua cruz. Essa é a realeza escandalosa de Jesus: em um mundo cheio de pessoas injustiçadas, Ele aceitou morrer como um injusto, mas a sua morte derramou sobre toda a humanidade o sangue da justificação, isto é, a graça de sermos declarados justos não devido à nossa vitória sobre o pecado, mas devido às palavras daquele que nos absolve das nossas culpas e nos livra das nossas condenações.  
            Eis, portanto, o nosso Rei! Um homem pacífico, não violento, que morreu experimentando a violência deste mundo, mas que ressuscitou e se assentou à direita do trono de Deus Pai, para restaurar todas as coisas, para reconciliar e pacificar todas as criaturas no céu e na terra. A Ele suplicamos: Senhor Jesus Cristo, tu és a minha fonte, o meu fundamento, a minha consistência e a meta final da minha vida. Olha para o nosso mundo, ferido pelas injustiças praticadas por inúmeros ‘reis’ terrenos dominados pela ganância, corrompidos pelo poder e submissos à escravidão do dinheiro. Estende sobre todos nós o teu senhorio, o teu domínio salvífico, libertando-nos do domínio destrutivo do mal, absolvendo-nos de todo tipo de condenação, reconciliando-nos com a nossa própria verdade e pacificando-nos interiormente. Enfim, restabelece o direito, a justiça e a paz sobre a face da terra; defende os mais fracos, salva a vida dos indigentes, esmaga os opressores e restaura toda a criação de Deus, conduzindo-nos todos ao teu Reino eterno. Amém!

Pe. Paulo Cezar Mazzi

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