Missa do 33º dom.
comum. Palavra de Deus: Malaquias 3,19-20a; 2Tessalonicenses 3,7-12; Lucas
21,5-19.
Nenhum ser humano nasce pronto. Por
isso, a vida confia uma tarefa a cada um de nós: construir-se como pessoa. Essa
construção é diária e só estará terminada no momento da nossa ressurreição,
quando Deus completar a obra que começou em cada um de nós.
Diante da tarefa existencial de
construir-se como pessoa, alguns se dispõem a arregaçar as mangas e a
trabalhar. São pessoas que não se conformam com aquilo que o mundo lhes
oferece, mas procuram separar aquilo que convém ao seu crescimento daquilo que
não convém. Essas pessoas se dão ao trabalho de cavar fundo, dentro de si
mesmas, até encontrar a rocha, o fundamento firme e seguro, sobre o qual devem
realizar a construção de si. Mas há muitas outras pessoas que acham mais fácil levar
a vida na base do “copiar e colar”: elas preferem viver como parasitas,
encostando nos outros e se alimentando daquilo que é alheio, ao invés de
lançarem suas próprias raízes e produzirem o alimento de que são capazes. São
pessoas que, por medo ou por pura acomodação, não querem cavar fundo, mas
improvisar a vida na base da artificialidade e da superficialidade.
Seja para aqueles que se dão ao
trabalho de se construir, seja para aqueles que não querem assumir tal tarefa,
Jesus hoje faz um alerta: “Vós admirais estas coisas? Dias virão em que não
ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído” (Lc 21,6). Alguns poderiam
perguntar: ‘Se tudo será destruído, então para quê construir alguma coisa?’.
Essas palavras de Jesus se referiam ao Templo de Jerusalém, construção imponente
e admirável, símbolo da “eternidade” de Deus no meio do seu povo. Mas Jesus
profetiza a destruição daquele Templo de pedras, ocorrida no ano 70 d.C.,
justamente porque Jerusalém rejeitou Jesus, aquele que poderia salvá-la da
destruição.
Essa profecia de Jesus precisa falar
também conosco. Existem situações em nossa vida que consideramos “garantidas”,
como que “eternas”, em relação às quais depositamos toda a nossa confiança e
segurança. Isso pode se referir a um relacionamento, a uma conquista
profissional, à aquisição de um bem material, à modelagem ou à saúde do próprio
corpo ou até mesmo a algum crescimento na vida espiritual. Tudo isso pode ser
destruído, mas não por Deus, e sim por nós mesmos! A destruição daquilo que
hoje consideramos importante pode já estar acontecendo ou sendo preparada, seja
devido a atitudes erradas da nossa parte, seja também devido à falta de
atitude!
Deus permitiu a destruição do Templo
de Jerusalém para nos dizer que tudo aquilo que construímos tendo por base a
mentira, a injustiça ou o prejuízo a outras pessoas será destruído. “Não ficará
pedra sobre pedra”. Mas a destruição do Templo também indicava outra coisa na
época de Jesus: o início do fim dos tempos. Nosso tempo neste mundo é finito, e
temos de tomar consciência disso. Tanto a nossa história pessoal como a
história da humanidade caminha para um desfecho, que a Sagrada Escritura chama
de “Dia do Senhor”, o dia do Julgamento, dia em que Deus separará os bons dos
maus, os justos dos injustos, e retribuirá a cada um segundo as suas obras, dia
em que o fogo de Deus passará pela construção de cada um de nós, comprovando a
sua verdade ou desmascarando a sua mentira (cf. 1Cor 3,11-15). Esse fogo do Julgamento
de Deus é chamado pelo profeta Malaquias de “sol da justiça”: ele queimará a
palha – imagem bíblica das pessoas injustas, que secaram por não estarem enraizadas
em Deus, na Sua verdade e na Sua justiça –, mas para os que vivem segundo essa
verdade e essa justiça, esse Dia trará a salvação definitiva.
Jesus nos orienta como nos preparar
para esse Dia: 1) tomando cuidado
para não sermos enganados por pessoas que, com suas palavras, tentarão nos
desviar do verdadeiro Evangelho (v.8); 2)
não nos desesperando diante de guerras e revoluções – “É preciso que estas coisas
aconteçam primeiro, mas não será logo o fim” (Lc 21,9); 3) aprendendo a suportar perseguições que visam enfraquecer a nossa
fé e a nossa esperança em Cristo (v.12) – segundo Jesus, “esta será a ocasião
em que testemunhareis a vossa fé” (Lc 21,13); 4) por fim, desenvolvendo em nós a capacidade de resistir ao ódio
do mundo, pois ele rejeita o que não é seu. Essa resistência será possível se
confiarmos nas palavras de Jesus: “Mas vós não perdereis um só fio de cabelo da
vossa cabeça. É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida!” (Lc 21,18-19). O
mesmo Deus quer permitirá que as construções fundadas na mentira e na injustiça
desabem, cuidará até das coisas mínimas daqueles que fizeram d’Ele o fundamento
de suas vidas.
Eis, portanto, a atitude que nos é
pedida em nossa construção diária como pessoas e como discípulos de Jesus, como
homens e mulheres destinados ao Reino de Deus: permanecer firmes; perseverar! Perseverar
significa ser paciente, ter fortaleza interior; apesar de tudo, seguir com
firmeza, seguir em frente; tornar-se capaz de manter-se firme diante das dificuldades.
Perseverar significa suportar a tensão própria da vida, não afrouxando, nem
arrebentando diante das provações. O arco deve manter a sua tensão natural para
que a flecha seja lançada e atinja o alvo, e o nosso alvo é a salvação em Cristo.
Por isso, enquanto nos construímos como pessoas em meio às inseguranças e
incertezas desse mundo, dizemos como Paulo: “Sei em quem depositei a minha fé,
e estou certo de que ele tem poder para guardar o meu depósito, até aquele Dia”
(2Tm 1,12).
Enfim, não sejamos como alguns
cristãos da Igreja em Tessalônica, que abandonaram a construção de si mesmos
para viverem na ociosidade, na preguiça existencial, no comodismo e na
resignação, pois, segundo o apóstolo Paulo, a vida tem uma regra: “Quem não
quer trabalhar, também não deve comer” (2Ts 3,10): quem não aprofunda sua fé em
Cristo não deve reclamar, quando for derrubado pela força dos ventos
contrários; quem permite que a árvore da sua vida seja sugada diariamente por
parasitas não deve chorar e se lamentar, quando essa mesma árvore secar definitivamente;
enfim, quem não defende e não valoriza a construção de si mesmo não deve se
revoltar, quando dela não sobrar mais pedra sobre pedra.
Pe. Paulo Cezar
Mazzi
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