sexta-feira, 4 de julho de 2025

O SAMARITANO, MODELO DO VERDADEIRO DISCÍPULO DE JESUS

 Missa do 15º dom. comum. Palavra de Deus: Deuteronômio 30,14-18; Colossenses 1,15-20; Lucas 10,25-37.

 

            “Mestre, que devo fazer para receber em herança a vida eterna?” (Lc 10,25). Quem hoje procura por Jesus interessado na vida eterna? Grande parte das pessoas que creem, incluindo nós, procura por Jesus para questões da vida aqui e agora. Portanto, a pergunta desse homem, a respeito da vida eterna, por si só nos questiona: a vida eterna é uma saudável e necessária preocupação para nós? Aqui vale o alerta do apóstolo Paulo: “Se temos esperança em Cristo somente para esta vida, somos os mais dignos de compaixão de todos os homens” (1Cor 15,19).

            Segundo Jesus, a vida eterna, sinônimo de salvação, se alcança a partir dos dois principais mandamentos da Lei de Deus: Amá-lo de todo o coração e amar o próximo como a nós mesmos. Aqui cabem outros dois questionamentos: 1. A nossa relação com Deus é pautada no amor, ou no medo e na necessidade? Em outras palavras, nós buscamos a Deus, na oração pessoal e na celebração da missa, porque O amamos ou porque temos medo de que, se não o fizermos, as situações vão piorar, ou ainda porque necessitamos que Ele nos faça algo ou nos conceda algo? 2. Como anda o nosso amor ao próximo, em tempos de individualismo, de fechamento e de indiferença para com o outro?

            A pergunta que o homem faz a Jesus é muito válida para nós também: “E quem é o meu próximo?” (Lc 10,29). A resposta mais “natural” a essa pergunta seria afirmar que todo ser humano é o nosso próximo. Mas as coisas não são tão simples assim. Já na época de Jesus, o conceito de “próximo” havia sofrido múltiplas restrições: os judeus se abriam somente aos estrangeiros simpatizantes do judaísmo; os fariseus excluíam do seu amor os pecadores e samaritanos; os essênios faziam o mesmo com os que eles consideravam “filhos das trevas”. Hoje, o conceito de “próximo” está ferido pela polarização, de modo que não apenas nos sentimos dispensados de amar quem pensa diferente de nós, mas nos damos ao direito de até mesmo odiá-lo.

            Jesus responde à pergunta sobre o próximo através da conhecida “parábola do bom samaritano”. A atitude do sacerdote e do levita, que veem o homem caído e ferido, mas seguem adiante, pelo outro lado, é a nossa atitude moderna de ver os acontecimentos e dizer que “não temos tempo, não nos diz respeito, é problema das autoridades, há instituições encarregadas disso, são preguiçosos” (Pe. Nilo Luza). Além disso, todo o mundo vive correndo, com pressa. Quem enxerga o outro? Como enxergar alguém ao nosso lado, se os nossos olhos estão constantemente olhando para a tela do celular? Nós alegamos não ter tempo para nos envolver com questões sociais, mas perdemos tempo nos interessando por futilidades nas redes sociais...

            O que Jesus espera de nós, seus discípulos, é a sensibilidade do samaritano: “Chegou perto dele, viu e sentiu compaixão. Aproximou-se dele e fez curativos, derramando óleo e vinho nas feridas” (Lc 10,33-34). Como ficará claro no final da parábola, o samaritano “usou de misericórdia” para com o homem ferido. Ter atitude de misericórdia, segundo a concepção bíblica, é amar o próximo. A questão, portanto, não é afetiva, mas efetiva; não se trata de sentir afeto pela pessoa do outro, mas de deixar-se afetar pelo seu sofrimento, aproximar-se dele e oferecer a ajuda que está ao nosso alcance.

            Ao colocar o samaritano como modelo de todo discípulo seu, Jesus nos ensina que a principal pergunta a inquietar a nossa consciência e o nosso coração não é: “Quem é o meu próximo?”, mas “De quem estou sendo chamado(a) a me fazer próximo(a), neste momento?”. De quem você precisa se fazer próximo(a) neste momento? Do seu companheiro de trabalho? Da sua vizinha? Do seu cônjuge? Dos seus filhos? Dos seus pais? Dos seus avós? Na sua exortação apostólica “A alegria do amor”, o Papa Francisco afirmou que “a família foi desde sempre o ‘hospital’ mais próximo. Prestemo-nos cuidados, apoiemo-nos e estimulemo-nos mutuamente, e vivamos tudo isto como parte da nossa espiritualidade familiar” (AL, n.322).

Para cuidar daquele homem ferido, o bom samaritano precisou perder tempo, esquecer-se de si e dos seus afazeres. O próximo é assim: alguém que me recorda que o mundo não gira em torno de mim, dos meus problemas, projetos e necessidades. Escutemos a voz de Deus em nossa consciência e em nosso coração, para sabermos de quem somos chamados a nos fazer próximos, neste momento da nossa vida. Permitamos que Jesus nos ajude a enxergar a vida para além das nossas preocupações, dos nossos interesses, vendo aqueles que estão feridos e caídos à nossa volta e nos fazendo próximos deles. Deixemos com que o Espírito Santo desperte a força da compaixão dentro de nós, para que saibamos reagir com misericórdia quando, no caminho da vida, cruzarmos com alguém que está sofrendo.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 3 de julho de 2025

NOSSA MISSÃO: SER PRESENÇA QUE CONSOLA

 Missa do 14º. dom. comum. Palavra de Deus: Isaías 66,10-14; Gálatas 6,14-18; Lucas 10,1-12.17-20

           

            “O Senhor escolheu outros setenta e dois discípulos e os enviou dois a dois, na sua frente, a toda cidade e lugar aonde ele próprio devia ir” (Lc 10,1). O envio dos 72 discípulos fala da missão de cada um de nós. No dia a dia, a vida sempre nos coloca junto de pessoas. Embora isso pareça casual, não é; nós estamos junto dessas pessoas para ser ali a presença do próprio Jesus! Se há muitos que não sentem a presença de Deus é porque grande parte dos cristãos não encontra mais tempo, nem motivação, para se colocar junto das pessoas que precisam de consolação.

            Através do profeta Isaías, Deus prometeu fazer chegar ao povo de Israel a Sua consolação. Essa consolação é comparada ao leite que sai do seio da mãe que amamenta o filho; ela também é expressa na atitude de tomar a criança no colo, sentá-la sobre os joelhos e acariciá-la. Em outras palavras, para consolar, é preciso se fazer presente; é preciso esquecer-se por um tempo para dedicar tempo ao outro; é preciso deixar de lado o celular para se colocar junto da pessoa que precisa ser consolada. Na verdade, quando saímos de nós mesmos e dedicamos tempo para estar junto de uma pessoa que se encontra desolada, não é somente ela que recebe consolação; nós saímos da presença dela consolados também, pois “há mais alegria em dar do que em receber” (At 20,35).           

            Ao enviar os 72 discípulos para junto das pessoas que deveriam receber a alegria do Evangelho, Jesus disse: “A messe é grande, mas os trabalhadores são poucos. Por isso, pedi ao dono da messe que mande trabalhadores para a colheita” (Lc 10,2). Sempre foram poucas as pessoas que se dispõem a ajudar, mas essa falta de “consoladores”, de cristãos missionários, se agravou muito hoje, não só por causa do individualismo, mas também do comodismo e da indústria do entretenimento: ficar em casa assistindo séries ou jogando fecha as pessoas em si mesmas e as mantém afastadas daqueles que necessitam de uma presença consoladora.   

“Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: ‘A paz esteja nesta casa!’” (Lc 10,5). Na maior parte das casas não existe paz, mas conflito; quando não, solidão, tristeza e sensação de desamparo. Por outro lado, o acesso às casas das pessoas está cada vez mais restrito, por questão de segurança. Jesus nos provoca a romper com o fechamento e o distanciamento, e a criar formas de nos aproximar das pessoas. Se “Cristo é a nossa paz” (Ef 2,14) é porque Ele derrubou o muro da separação entre as pessoas e construiu a ponte da reaproximação. Sempre que nos esforçamos em ser ponte, nós geramos paz no coração das pessoas. Também a oração de São Francisco nos incentiva a sermos instrumentos da paz: “Onde há ódio, que eu leve o amor; onde há tristeza, que eu leve alegria; onde há desespero, que eu leve a esperança...”.

“Os setenta e dois voltaram muito contentes, dizendo: ‘Senhor, até os demônios nos obedeceram por causa do teu nome’” (Lc 10,17). Sempre que vivemos com fidelidade a missão que somos, nos colocando junto das pessoas que precisam da consolação que vem de Cristo, os demônios vão embora: o demônio da tristeza, da solidão, do sentimento de nada valer; o demônio que divide, separa e alimenta conflito; o demônio da falta de diálogo, de perdão e de reconciliação... Falta-nos confiar nas palavras de Jesus: “Eu vos dei o poder de pisar em cima de cobras e escorpiões e sobre toda a força do inimigo” (Lc 10,19). O veneno do mal não tem poder sobre quem vive na obediência a Jesus e ao seu Evangelho. O óleo da unção do Espírito Santo não permite que o maligno nos agarre e nos mantenha presos em suas mãos.

Enfim, que o envio dos 72 discípulos nos recorde mais uma vez o convite do Papa Francisco a toda a nossa Igreja: “Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo! Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de sentido e de vida” (Papa Francisco, A alegria do Evangelho, n.49).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 26 de junho de 2025

IGREJA QUER DIZER NUNCA ABANDONAR OU ESQUECER

 Missa de São Pedro e São Paulo apóstolos. Palavra de Deus: Atos dos |Apóstolos 12,1-11; 2Timóteo 4,6-8.17-18; Mateus 16,13-19.

 

Em 2002 foi lançado o desenho Lilo & Stitch, cuja mensagem principal é esta: “Ohana quer dizer família. Família quer dizer nunca abandonar ou esquecer”. Por razões que desconheço, depois de 23 anos Stitch está altamente na moda, enriquecendo o mercado de produtos para crianças. Aproveito dessa onda para refletir sobre o sentido da nossa Igreja a partir dessa frase: “Ohana quer dizer família. Família quer dizer nunca abandonar ou esquecer”.

Por que Jesus quis instituir aquela que ele chamou de “minha Igreja”? Porque ele quis formar uma família, como muito bem entendeu o apóstolo Paulo: “Vocês já não são estrangeiros e imigrantes, mas concidadãos dos santos e membros da família de Deus” (Ef 2,19). Da mesma forma como Jesus “veio procurar e salvar o que estava perdido” (Lc 19,10), ele quis a sua Igreja como uma família onde todos se sintam acolhidos e ninguém se sinta rejeitado, abandonado ou esquecido, pois “não é da vontade de vosso Pai, que está nos céus, que nenhum destes pequeninos se perca” (Mt 18,14), sabendo que “pequeninos” são todos aqueles que ainda não têm uma fé profunda, nem esclarecida.

Como muito bem entendeu o Papa Francisco, Jesus instituiu a Igreja para ser “um hospital de campanha após a batalha, cuidando das feridas de seus fiéis e saindo para encontrar os que foram machucados, excluídos ou que se afastaram” (Papa Francisco, março de 2013). Vivemos em um mundo doente, um mundo que fere e adoece as pessoas física, emocional e espiritualmente. Embora a Igreja esteja presente neste mundo e também esteja, de alguma forma, adoecida, ela precisa se manter fiel à sua missão de ser um médico para os que estão doentes, uma luz para os que estão na escuridão da desorientação, uma rede que resgata do mar da vida os que estão se afogando em situações de morte, uma casa para a qual cada filho perdido sabe que pode voltar. Exatamente como seu Fundador, a Igreja não existe para condenar o mundo, mas para salvá-lo. Portanto, o nosso lugar como Igreja é junto das pessoas que mais estão necessitadas de salvação.

A festa dos apóstolos Pedro e Paulo se apresenta como uma ocasião oportuna para recordarmos que a nossa Igreja nasceu da vontade do Pai, do sacrifício do Filho e da ação do Espírito Santo. Isso fica muito claro quando o apóstolo Paulo se despede dos presbíteros da cidade de Éfeso: “Estai atentos a vós mesmos e a todo o rebanho: nele o Espírito Santo vos constituiu guardiães, para apascentar a Igreja de Deus, que ele adquiriu para si pelo sangue do seu próprio Filho” (At 20,28). A nossa Igreja nasceu na cruz de Cristo, quando “ele morreu para reunir todos os filhos de Deus dispersos” pela terra (cf. Jo 11,52). Portanto, se Cristo morreu para reunir todos os filhos de Deus, nós não podemos alimentar discursos e atitudes que causem separação, divisão ou dispersão na Igreja de Deus.

Nossa fé, enquanto Igreja, encontra-se altamente influenciada pelas redes sociais. É grande o número de cristãos que se acomodaram em suas casas e decidiram não frequentar mais a sua igreja paroquial. A fé deixou de ser comunitária para se tornar individualista. Essa escolha revela a falta de vontade de viver com o outro, de conviver, de pertencer a uma comunidade e de se responsabilizar por ela. Muitos ajudam financeiramente pregadores virtuais, canais de evangelização, construções de igrejas Brasil afora, mas não socorrem as necessidades da paróquia à qual pertencem. Além disso, o gosto pessoal se tornou mais importante do que a escuta do Evangelho: elogia-se o pregador virtual enquanto se critica o pregador real.

Alguns dados do Censo de 2022 provocaram grande alegria em setores católicos, revelando a diminuição da perda de católicos para igrejas evangélicas. Além disso, a forma como a mídia cobriu a morte do Papa Francisco e a eleição do Papa Leão XIV passou a falsa impressão do quanto a nossa Igreja Católica tem grande importância para o mundo. Não podemos nos enganar quanto a isso: o destino da nossa Igreja é o destino do seu Fundador. Quanto mais a nossa Igreja se tornar “importante” para o mundo, mais significa que ela está se distanciando do Evangelho. Jesus deixou muito claro que os verdadeiros profetas serão odiados e perseguidos (cf. Mt 5,11-12), e que o mesmo mundo que o odiou, odiará os que são da sua Igreja (cf. Jo 15,18-19). Quem deseja ser reconhecido pelo mundo ao abraçar um trabalho pastoral na Igreja não entendeu nada a respeito do Evangelho.

Que o destino da Igreja é o mesmo do seu Fundador está claro nos textos bíblicos de hoje: São Pedro e São Paulo estão presos; ambos morrerão por causa do Evangelho; ambos sofreram muito, por causa do anúncio do Evangelho; ambos nos ensinaram que ser cristão é combater o bom combate, completar a corrida e manter vida sua fé. O primeiro combate a combater é contra o nosso ego e os nossos pecados. O segundo combate é contra o espírito do mal, que deseja destruir a Igreja de Cristo atacando-a a partir de dentro, suscitando ódio do rebanho em relação aos seus próprios pastores (CNBB). Além do bom combate, temos que completar o Caminho que começamos a fazer, quando Cristo nos chamou. Apesar de todos os tropeços e de todas as quedas, precisamos nos levantar todos os dias e retomar esse Caminho, sustentados pela força do Espírito Santo. Enfim, devemos manter a nossa fé, lembrando de que “não somos pessoas que abandonaram o Caminho para se perderem, mas pessoas de fé, para a conservação da nossa vida” (citação livre de Hb 10,39).

“Tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja” (Mt 16,18). Jesus foi um construtor. Ele construiu inúmeras pontes que religaram pessoas a Deus e pessoas entre si. Nossa Igreja é chamada a fazer a mesma coisa. Sejamos cristãos construtores, e não cristãos consumidores, em nossa própria Igreja. Não nos esqueçamos de que a insignificância da nossa Igreja na vida de muitas pessoas é fruto da sua ausência junto delas, uma ausência que começa por nós, católicos. Vale lembrar que “a Igreja que vai impactar mundo não é a que você está indo, é a que você está sendo!” (autor desconhecido). A ausência da nossa Igreja junto de inúmeras pessoas do nosso tempo é a nossa ausência como Igreja junto delas. Que cada um de nós assuma o seu lugar na Igreja como “pedra viva” (1Pd 2,5).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

 

sexta-feira, 20 de junho de 2025

SÓ AS LÁGRIMAS DA REALIDADE PODEM NOS LIVRAR DA VISÃO FANTASIOSA SOBRE NÓS MESMOS

 Missa do 12º dom. comum. Palavra de Deus: Zacarias 12,10-11.13,1; Gálatas 3,26-29; Lucas 9,18-24.

 

“Jesus estava rezando num lugar retirado” (Lc 9,18). O Evangelho nos coloca não somente diante da oração de Jesus, mas deixa entrever o conteúdo da sua oração: “Quem eu sou?”. Qual a razão da minha existência? Por que eu estou neste mundo? Qual é a minha missão? A oração é o lugar onde a nossa vida pode encontrar o seu verdadeiro sentido. Na oração, o filho pergunta ao Pai: Por que o Senhor me chamou à existência? O que o Senhor quer que eu faça? Tomar consciência da razão da nossa existência nos ajuda a não nos perder na desorientação do mundo atual.

A resposta que Jesus buscava na sua oração – “Quem eu sou?” – não foi dada diretamente pelo Pai, mas pelos discípulos. Da mesma forma acontece conosco: Deus não nos fala diretamente, mas por meio de pessoas, de acontecimentos e da nossa própria consciência. O povo tinha várias opiniões a respeito de Jesus: Ele lembrava Elias, João Batista ou algum dos outros profetas. Essa diversidade de opiniões também está na presente na forma como vemos as pessoas e na forma como elas nos veem: são os rótulos – “Esse é de direita”; “Aquele que é de esquerda”; “Esse é conservador”; “Aquele é progressista”.

Diante de tantos rótulos, cada um de nós precisa responder a si mesmo: “Quem eu sou?”. Com quais valores eu me identifico? Como eu entendo a razão pela qual estou aqui, neste mundo? Para além da superficialidade dos rótulos, Pedro disse a Jesus como o via: “O Cristo de Deus” (Lc 9,20). Jesus é exatamente isso: o Cristo, o Ungido de Deus! O problema é que, tanto para Pedro como os demais discípulos, identificar Jesus como o Cristo significava enxergá-lo como o líder político e militar que libertaria Israel do domínio romano. Mas a missão de Jesus não era essa; por isso ele “proibiu-lhes severamente que contassem isso a alguém” (Lc 9,21).

Vivendo num mundo onde ninguém enxerga ninguém e onde os valores estão invertidos, nós facilmente caímos na tentação de nos sentirmos “o cristo”, ou seja, uma pessoa que será uma vitoriosa num mundo de fracassados, será alguém que enxerga num mundo onde todos são cegos, será um forte num mundo cheio de fracos. A ironia é que, principalmente por influência das redes sociais, nós somos imitadores dos outros: curtimos o que todos curtem, aplaudimos o que todos aplaudem, consumimos o que todos consomem porque, no fundo, somos movidos pela necessidade de aceitação: se formos diferentes dos outros, não seremos aceitos por eles.

Jesus, por ser livre dessa armadilha da aceitação alheia, foi tomando consciência da sua missão: “O Filho do Homem deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto e ressuscitar no terceiro dia” (Lc 9,22). Enquanto nós entendemos a vida na base do “eu quero” – quero vencer, quero ser grande e importante –, Jesus foi compreendendo na sua oração que o sentido da sua vida não estava no “eu quero”, mas no “eu devo”. Quem se orienta somente pelo “eu quero” acaba por ser infiel à sua missão e segue pela vida desorientado, como folha seca empurrada pelo vento. Somente quem tem consciência do seu “eu devo” não perde a direção do rumo que tem que tomar, para realizar a missão para a qual foi chamado.  

Estando consciente do seu “eu devo”, Jesus lançou um desafio para toda e qualquer pessoa que deseja se tornar sua discípula: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me. Pois quem quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará” (Lc 9,23-24). Enquanto o mundo provoca o nosso ego a se colocar no centro de tudo, Jesus nos desafia a frustrar o nosso ego, que só busca o que lhe agrada e o que lhe interessa, para colocar no centro das nossas atitudes a consciência do nosso dever. Tomar a cruz cada dia significa ser fiel à missão que recebemos do Pai, ao nos chamar à existência; significa não nos colocar no centro e não termos medo de sermos desprezados, de sermos cancelados dos contatos das pessoas por não nos sujeitarmos a ser a reprodução da mediocridade que elas se tornaram, só para serem aceitas por uma sociedade que valoriza o fútil, o vazio, a superficialidade, o ridículo.

“Eles olharão para mim. Ao que eles feriram de morte, hão de chorá-lo, como se chora a perda de um filho único, e hão de sentir por ele a dor que se sente pela morte de um primogênito” (Zc 12,10). A pergunta sobre “quem eu sou?” está diretamente relacionada sobre “quem Deus é para mim?”. Deus se identifica com o fracassado, não com o vitorioso; Ele se encontra onde há dor, não onde há uma alegria egoísta e indiferente ao sofrimento alheio. “Naquele dia, haverá um grande pranto em Jerusalém... Naquele dia, haverá uma fonte acessível à casa de Davi e aos habitantes de Jerusalém, para ablução e purificação” (Zc 12,11; 13,1). Nossos olhos precisam chorar. As lágrimas da dor da realidade à nossa volta precisam limpar nossos olhos, para enxergarmos melhor quem é Deus e quem nós somos. Já passou da hora de nos despirmos da fantasia da grandeza, da vaidade, do “aparentar ser”, do aparecer, para nos revestirmos de Cristo (cf. Gl 3,27), de forma que as pessoas enxerguem em nós não uma caricatura de cristãos, mas verdadeiros discípulos d’Aquele que sempre buscou na oração tomar consciência da sua verdadeira missão neste mundo.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi   

quinta-feira, 12 de junho de 2025

SÓ O ESPÍRITO DA VERDADE NOS REVELA O PAI E O FILHO

 Missa da Santíssima Trindade. Palavra de Deus: Provérbios 8,22-31; Romanos 5,1-5; João 16,12-15.

           

O nosso Deus é comunhão. Ele nunca esteve só. Desde o início da criação, já se revela que Deus não estava sozinho ao criar todas as coisas: “Quando preparava os céus, ali estava eu... Eu estava ao seu lado como mestre-de-obras; eu era o seu encanto, dia após dia, brincando o tempo todo em sua presença” (Pr 8,27.30). Essa presença misteriosa é a presença do Filho: “Tudo foi feito por meio dele, e sem ele nada foi feito” (Jo 1,3); “Nele foram criadas todas as coisas, nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis” (Cl 1,16). A solenidade da Santíssima Trindade nos ensina que o Pai criou todas as coisas em seu Filho Jesus Cristo, e colocou em todas elas a Sua vida, o Seu Espírito.

Da mesma forma como a obra da criação é fruto da comunhão do Pai, do Filho e do Espírito Santo, a obra da redenção também o é. Como afirmou o apóstolo Paulo, “estamos em paz com Deus, pela mediação do Senhor nosso, Jesus Cristo” (Rm 5,1). Se o pecado havia nos separado do Pai, o Filho realizou a obra da reconciliação, restabelecendo a nossa comunhão com o Pai. Essa comunhão com o Pai não é estática, mas dinâmica: ela se movimenta e sofre mudanças, conforme a nossa existência também se movimenta e sofre mudanças. É por isso que o apóstolo Paulo afirma que o fato de estarmos em paz com Deus – reconciliados em seu Filho Jesus Cristo – não significa ter uma vida poupada de tribulações.

“A tribulação gera a constância” (Rm 5,3). Num primeiro momento, a tribulação provoca angústia, incerteza, dúvida, porque nós a interpretamos como ausência de Deus. Mas a função da tribulação não é desfazer a nossa fé em Deus, e sim nos educar para a constância: quando estamos vivenciando uma situação de tribulação, devemos nos manter constantes em nossa oração, em nossos compromissos com Deus. Muitos relacionamentos terminaram e muitos compromissos foram abandonados porque as pessoas não tiveram paciência em aprender a ser constantes. Essa constância não depende das circunstâncias externas serem favoráveis, mas se alimenta da convicção interna de que devemos prosseguir com nossos projetos, apesar das tribulações.

“A constância leva a uma virtude provada” (Rm 5,4). Só quem permanece constante torna-se uma pessoa virtuosa, uma pessoa que desenvolve o hábito de fazer o bem, independente das circunstâncias à sua volta serem favoráveis ou não. Uma virtude provada significa a disposição em fazer o bem ou caminhar segundo a verdade mesmo que isso lhe custe sofrimento. Essa “prova” da virtude aparece no livro do Eclesiástico: “Meu filho, se te ofereces para servir o Senhor, prepara-te para a prova. Endireita o teu coração e sê constante, não te apavores no tempo da adversidade” (Eclo 2,1-2).

“A virtude provada desabrocha em esperança” (Rm 5,4). Somente quem tem esperança suporta a imperfeição do presente e não abandona o seu compromisso com o bem por causa das adversidades do tempo presente. A nossa esperança não é uma esperança humana, isto é, uma esperança que se apoia em garantias humanas, mas uma esperança nascida do amor de Deus, sabendo que nada pode nos separar do amor do Pai manifestado em Cristo Jesus (cf. Rm 8,38-39).

“A esperança não decepciona, porque o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado” (Rm 5,5). O Espírito Santo está em nós como amor do Pai e do Filho. Ele nos garante que o Pai completará a obra que começou em cada um de nós, até o dia da vinda de seu Filho Jesus Cristo (cf. Fl 1,6). Esse amor do Pai e do Filho sustenta a nossa esperança, como afirma o salmista: “Os olhos do Senhor estão voltados sobre aqueles que esperam em seu amor... Senhor, que teu amor esteja sobre nós, assim como está em ti nossa esperança!” (Sl 33,18.22).  

Enfim, a nossa esperança está assentada numa promessa de Jesus: “Quando vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à plena verdade” (Jo 16,13). Nosso mundo está mergulhado na desorientação da mentira, e essa desorientação está adoecendo cada vez mais a humanidade. Só existe um caminho de cura para a doença da mentira, da desorientação: o Espírito da Verdade. Só a Verdade cura. Essa Verdade não nos pode ser revelada totalmente, mas aos poucos, na medida em que conseguimos compreendê-la e nos deixar orientar por ela. “A verdade é um livro que nenhum de nós nunca leu até o fim” (Pe. Thomás Halik). Isso significa que nenhuma pessoa ou religião pode se apossar do Espírito da Verdade e presumir-se o seu único intérprete. Devemos caminhar com humildade e pedir ao Espírito da Verdade que nos guie na noite escura da nossa vida, até que possamos ver face a face (cf. 1Cor 13,12).

 

Oração: Espírito da Verdade, revela-nos o amor do Pai e do Filho. Retira-nos do isolamento e da solidão, e desperta em nós o desejo da comunhão. Que o Teu amor nos ensine a amar as pessoas como elas são, e não como nós gostaríamos que elas fossem. Sustenta-nos com a Tua graça em nossas tribulações, concedendo-nos constância, virtude comprovada e uma esperança que não decepciona. Que a nossa esperança esteja em Ti da mesma forma como o Teu amor está em nós. Neste mundo desorientado, adoecido e perdido, toma cada um de nós em Tuas mãos e conduz-nos na luz da Tua verdade, até que possamos contemplar o Pai e o Filho face a face. Amém.   

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi       

 

quinta-feira, 5 de junho de 2025

SEM A LUZ QUE ACODE, NADA O HOMEM PODE

 Missa de Pentecostes. Atos dos Apóstolos 2,1-11; 1Coríntios 12,3b-7.12-13; João 20,19-23.

 

No dia de Pentecostes, Deus derramou sobre os apóstolos o dom do Espírito Santo. Mas esse dom não está reservado somente para o dia de Pentecostes. O próprio Jesus, ao ensinar a oração do Pai Nosso, disse que o Pai nos dará o Espírito Santo sempre que o pedirmos (cf. Lc 11,13). Pedir o dom do Espírito Santo é tão necessário quanto pedir o pão nosso de cada dia! Só Ele pode transformar em nossa vida aquilo que não podemos por nós mesmos. Como ensina a oração da Igreja, é o Espírito Santo quem dá repouso ao cansado, levanta o que caiu, aquece o que está frio, cura o que está ferido, encoraja o que está paralisado pelo medo, fortalece o que se sente fraco, ressuscita o que está morto, reúne o que está disperso, santifica o que está marcado pelo pecado, lava o que está sujo, endireita o que está torto...

A palavra “Pentecostes” está ligada ao número “cinquenta”, e cinquenta significa “plenitude”. O Espírito Santo sempre parte de onde nós estamos, daquilo que somos, para nos levar aonde Deus quer que estejamos, para nos conduzir à nossa plenitude como pessoas e filhos de Seus. Porém, essa plenitude só é alcançada quando aceitamos que o Espírito de Deus nos exponha a provações, desafios e dificuldades que irão nos conduzir à verdade plena, pois ele é o Espírito da Verdade (cf. Jo 16,13).

O Espírito Santo foi descrito no evento de Pentecostes por meio das imagens do vento e das línguas de fogo (cf. At 2,2-3). Enquanto vento de Deus, o Espírito Santo nos sacode fortemente com o Seu vento para nos despertar, para nos desacomodar, para nos impulsionar a enfrentar os desafios ao invés de fugirmos deles. O nosso grande desafio é acolher o vento do Espírito, que “sopra onde quer” (Jo 3,8) e nos leva para onde devemos ir, não para onde gostaríamos de ir, como disse o apóstolo Paulo: “Agora, acorrentado pelo Espírito, dirijo-me a Jerusalém, sem saber o que lá me sucederá. Senão que, de cidade em cidade, o Espírito Santo me adverte dizendo que me aguardam cadeias e tribulações” (At 20,22-23). Se queremos experimentar a força transformadora do Espírito Santo, precisamos nos deixar “agarrar” por Ele e aceitar que Ele nos conduza para onde Ele quer, da forma como Ele quer.

E as línguas de fogo? As línguas favorecem nossa comunicação. Quando as línguas de fogo desceram sobre os apóstolos, eles começaram a falar de Deus de modo que todas as pessoas, independente da sua nacionalidade, podiam entender (cf. At 2,4.6.8.11). Diante da “Torre de Babel” em que às vezes se transforma a nossa casa, o nosso ambiente de trabalho, a nossa comunidade de fé, o nosso relacionamento com os outros – sabendo que essa confusão nos divide e nos impede de construir qualquer coisa juntos (cf. Gn 11,7.9) – precisamos silenciar, acolher e obedecer à voz do Espírito, que sempre se manifesta a cada um em vista do bem comum, em vista de restaurar a unidade do Corpo, lembrando a oração da Igreja: “Vosso Espírito Santo move os corações, de modo que os inimigos voltem à amizade, os adversários se deem as mãos e os povos procurem reencontrar a paz” (Oração sobre a Reconciliação II). Toda pessoa que age movida pelo Espírito Santo, trabalha pela unidade e pela comunhão, jamais pela divisão ou separação dentro da Igreja (cf. 1Cor 12,4-6.12-13). 

As línguas que desceram sobre os apóstolos eram “línguas como que de fogo”. Esse fogo aponta para a força transformadora do Espírito Santo em nós. O fogo endurece o barro (firmeza), purifica o metal (santidade) e funde o ferro (transformação). Precisamos que o Espírito Santo nos torne firmes, pois não recebemos um espírito de medo, mas de força (cf. 2Tm 1,7); que o Seu fogo queime nossas impurezas e nos torne uma oferenda santa para o Senhor; que Ele realize a grande transformação que Deus prometeu: “Eu darei a vocês um coração novo... Porei no íntimo de vocês o meu espírito... Porei o meu espírito em vocês e vocês viverão” (Ez 36,26.27; 37,6). Todos nós precisamos passar por uma profunda transformação, por uma reforma, por uma modificação. Mas isso só é possível por meio do Espírito Santo: “Não pela força, não pelo poder, mas por meu espírito, diz o Senhor” (Zc 4,6).              

Em muitos de nós há um medo inconsciente a respeito do Espírito Santo. Temos medo do que Ele possa fazer conosco e em nós; temos medo da Sua profundidade e de que Ele nos leve ao profundo de nós mesmos; temos medo de para onde Ele possa nos conduzir; temos medo da Sua liberdade, pois Ele sopra onde quer; temos medo porque não podemos controlar o Espírito... Quando esses medos forem reconhecidos e superados, quando pararmos de resistir ao Espírito Santo, quando tivermos a coragem de nos lançar nos Seus braços e de nos abrir à Sua graça, quando permitirmos que Ele penetre em nossas profundezas e toque nas nossas raízes mais profundas, então começaremos a nos tornar homens e mulheres novos, renovados, transformados...

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 29 de maio de 2025

SER O CÉU NA TERRA E VIVER SOB A PODEROSA MÃO DO SENHOR JESUS

 Missa da Ascensão do Senhor. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 1,1-11; Efésios 1,17-23; Lucas 24,46-53.

 

            “Vencendo o pecado e a morte, vosso Filho, Jesus, rei da glória, subiu hoje ante os anjos maravilhados ao mais alto dos céus. E tornou-se o mediador entre vós, Deus, nosso Pai, e a humanidade redimida, juiz do mundo e Senhor do universo. Ele, nossa cabeça e princípio, subiu aos céus, não para afastar-se de nossa humildade, mas para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade” (Prefácio da Ascensão I).

            Essas palavras a respeito da Ascensão de Jesus nos recordam que, ao subir para o céu e sentar-se à direita de Deus Pai, Cristo Jesus se tornou mediador, juiz e Senhor. Enquanto mediador, ele é a ponte que liga o céu à terra e a terra ao céu, de modo que, “por meio dele, todos nós temos acesso ao Pai” (cf. Ef 2,18). Essa mediação também significa que “Cristo entrou no céu, a fim de comparecer, agora, diante da face de Deus a nosso favor” (Hb 9,24). Enquanto juiz, Cristo Jesus virá do céu um dia para julgar os vivos e os mortos (cf. Mt 25,31-32): “Eis que ele vem com as nuvens, e todos os olhos o verão” (Ap 1,7). Enquanto Senhor, Jesus recebeu do Pai todo o poder no céu e sobre a terra: “Ele pôs tudo sob os seus pés e fez dele, que está acima de tudo, a Cabeça da Igreja” (Ef 1,22). Enfim, a presença de Jesus no céu, junto ao Pai, nos dá a certeza de que estamos destinados a participar da sua glória: “Dos céus aguardamos como Salvador o Senhor Jesus Cristo, que transfigurará nosso corpo humilhado, conformando-o ao seu corpo glorioso” (Fl 3,20-21). 

            Crer no céu significa nos lembrar de que “nós não temos aqui cidade permanente, mas estamos à procura da cidade que está para vir” (Hb 13,14). Isso significa que qualquer situação que vivamos neste mundo é transitória e não definitiva. Estamos aqui apenas de passagem. Crer no céu também significa crer na recompensa que toda pessoa receberá por ser justa e por ser solidária com quem sofre: “Tu receberás a recompensa na ressurreição dos justos” (cf. Lc 14,14; 16,9). Pelo contrário, aqueles que não creem no céu não veem sentido em serem bons, justos e solidários: “Sua maldade os cega. Eles não esperam prêmio pela santidade, não creem na recompensa das almas puras” (Sb 2,21-22).

            Uma vez que nós somos “cidadãos do céu” (Fl 3,20), nossa missão é ser o céu na terra. Essa missão foi anunciada por Jesus aos apóstolos antes de ele subir para o céu: “Recebereis o poder do Espírito Santo que descerá sobre vós, para serdes minhas testemunhas” (At 1,8). Sentado à direita do Pai, Jesus derrama constantemente o Espírito Santo sobre cada discípulo seu, para que este seja a Sua presença junto às pessoas, especialmente as que sofrem. Enquanto estava na terra, Jesus era o “Deus conosco”. Agora que ele está no céu, nos envia o Espírito Santo para ser “Deus em nós”. E a presença do Espírito Santo nos revela duas verdades: 1) “Jesus Cristo é o Senhor” (1Cor 12,3), aquele a quem o Pai concedeu o poder de julgar e salvar todo ser humano; 2) Não somos órfãos, mas recebemos o Espírito do Filho que clama em nós: “Abbá, ó Pai” (Rm 8,15). Nossa vida neste mundo deve ser vivida na consciência de que estamos debaixo do poder salvífico de Jesus e de que somos cuidados pelo Pai.

            O último gesto de Jesus, antes de subir para o céu, foi erguer as mãos e abençoar seus discípulos: “Ali ergueu as mãos e abençoou-os. Enquanto os abençoava, afastou-se deles e foi levado para o céu” (Lc 24,50-51). “Enquanto Moisés mantinha as mãos erguidas, Israel vencia a luta” (Ex 17,11). As mãos erguidas de Jesus sobre nós são a garantia de que venceremos nossas lutas; venceremos principalmente os obstáculos que nos impedem de anunciar o Evangelho e viver a nossa fé com fidelidade. No entanto, precisamos todos os dias nos colocar debaixo das mãos do Senhor Jesus, imitando a atitude do salmista: “Piedade de mim, ó Deus, tem piedade de mim, pois eu me abrigo à sombra de tuas asas, até que passe o perigo. Clamo ao Deus Altíssimo, ao Deus que faz tudo por mim: que do céu ele mande salvar-me, confundindo os que me atormentam. Que Deus envie seu amor e verdade!” (Sl 57,2-4).

            Sigamos confiantes na missão que o Ressuscitado nos confiou, certos de que sua bênção nos acompanha, e nos preparemos para receber a renovação do dom do Espírito Santo em nós, confiando na sua promessa: “Eu enviarei sobre vós aquele que meu Pai prometeu” (Lc 24,48).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 22 de maio de 2025

NÃO SE INTIMIDE PERANTE OS DESAFIOS QUE A VIDA LHE APRESENTA

 Missa do 6º dom. Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 15,1-2.22-29; Apocalipse 21,10-14.22-23; João 14,23-29.

 

“Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada” (Jo 14,23). Onde Deus mora? Normalmente, nós vamos a um templo, a uma igreja, para nos encontrar com Deus. Jesus nos surpreende ao revelar que o Deus que é amor mora num coração que ama – mais do que isso, num coração que não desiste de amar. Se muitas pessoas se relacionam com Deus movidas por alguma necessidade ou por medo de que, sem Ele, tudo desabe, Jesus nos convida a nos relacionar com ele e com o Pai movidos pelo amor. Este é o grande desafio da nossa vida de fé: caminhar com o Pai e com o Filho não porque precisamos de algo que eles nos deem, mas porque eles nos amam e nós queremos viver nesse amor.

Já no Antigo Testamento Deus havia deixado claro: “É amor que eu quero, não sacrifícios” (Os 6,6). Qualquer sacrifício que desejemos oferecer a Deus, se não nos levar a amar, de nada vale. Jesus explica que amá-lo consiste concretamente em guardar a sua palavra, o que significa viver segundo o mandamento do amor: “Como eu vos amei, assim também deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34). Como é o nosso relacionamento com Jesus? Quem ama deseja estar junto do amado. Nós reservamos um tempo diário para estar com Jesus, na oração? Se é verdade que Jesus está presente de modo mais concreto naqueles que não são amados neste mundo, nós procuramos amar essas pessoas?       

Estamos caminhando para o final do tempo da Páscoa, o qual se encerrará com a festa de Pentecostes. Por isso, Jesus nos fala da vinda do Espírito Santo: “O Defensor, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ele vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que eu vos tenho dito” (Jo 14,26). Do quê nós precisamos ser defendidos? Não só do espírito do mal que age no mundo, mas também do nosso pecado, das nossas infidelidades. Precisamos ser defendidos de nós mesmos, da nossa preguiça espiritual, do comodismo, de uma vida fechada em si mesma e, por isso, indiferente às necessidades do próximo e da nossa própria Igreja. Precisamos ser defendidos do nosso medo e da nossa covardia perante os desafios que a vida nos chama a enfrentar. Sobretudo, precisamos ser defendidos das mentiras e das desinformações que as redes sociais despejam sobre nós todos os dias, recorrendo ao Defensor, que também é chamado por Jesus de “Espírito da Verdade” (Jo 15,26).

Ao anunciar a sua volta para o Pai, Jesus nos deixa a sua paz: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; mas não a dou como o mundo” (Jo 14,27). O mundo não tem paz alguma para nos dar; muito pelo contrário. Já a paz que Jesus nos dá nasce da sua absoluta confiança no Pai. Ele quer que vivamos dessa confiança: “O Pai é maior do que eu” (Jo 14,28). O Pai é maior do que tudo o que nos acontece. O Pai é maior inclusive do que o nosso próprio coração, quando nos acusa de alguma falha: “Deus é maior que o nosso coração e conhece todas as coisas” (1Jo 3,20). Ainda a respeito da paz que Jesus nos dá, devemos recordar das palavras de São Francisco de Assis: “Se algo rouba a paz do teu coração, é porque ocupou o lugar de Deus”.

Por fim, Jesus nos dá um conselho: “Não se perturbe nem se intimide o vosso coração” (Jo 14,28). A perturbação nasce da falta de confiança no Pai. Ela também tem como fonte perder-se nas urgências e não cuidar do essencial. Já o coração intimidado é um coração retraído diante da existência; um coração que, ao invés de se deixar conduzir pela força do Espírito Santo, se deixa dominar pela própria covardia frente aos desafios da vida. Se queremos superar essa intimidação diante da realidade, devemos nos recordar do conselho do Papa Francisco: “Importa cuidar do trigo e não perder a paz por causa do joio” (EG n.24). Trata-se de manter o foco e concentrar nossas energias no bem que podemos fazer, e não desperdiçar energia tentando anular o mal que existe no mundo.

Na medida em que nos preparamos para a festa de Pentecostes, recordemos esses quatro pontos do Evangelho: 1. Pautar o nosso relacionamento com o Pai e com o Filho pelo amor, e não pelo medo, muito menos pelo interesse; 2. Obedecer à voz do Defensor em nossa consciência e não cair no erro de, enquanto com uma das mãos pedimos a sua ajuda, com a outra nos mantemos presos ao nosso pecado de estimação; 3. Amar e promover a paz, lembrando de que ela só nos habita quando estamos na vontade de Deus – sempre que nos afastamos dessa vontade, perdemos a paz; 4. Não se perturbar nem se intimidar perante os desafios que a vida nos apresenta, mas aprender a confiar a Deus as nossas preocupações e nos manter firmes em nosso propósito, sabendo que “o vento pode soprar o quanto quiser; a montanha jamais se curva diante dele” (provérbio chinês).  

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 15 de maio de 2025

SÓ EXPERIMENTA VIDA QUEM NÃO DESISTE DE AMAR, APESAR DOS FERIMENTOS

 Missa do 5º. Dom. Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 14,21b-27; Apocalipse 21,1-5a; João 13,31-33a.34-35.

 

            “Nós sabemos que passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos. Aquele que não ama, permanece na morte” (1Jo 3,14). Estamos no 5º domingo da Páscoa. Só pode experimentar Páscoa, isto é, só pode fazer a passagem da morte para a vida quem decide amar. Sim, amar é uma decisão. Em um mundo onde o mal cresce sempre mais, onde as pessoas se tornam cada vez mais egoístas, individualistas, interesseiras, agressivas e intolerantes, só é possível amar tomando a decisão de perseverar no amor até o fim, recordando o que Jesus disse: “Devido ao crescimento da maldade, o amor de muitos esfriará. Aquele, porém, que perseverar até o fim, esse será salvo” (Mt 24,12).   

            Muitos deixaram de perseverar no amor, por terem sido feridos e traídos. Como não receberam mais amor dos outros, decidiram também deixar de amar, e por deixarem de amar, se permitiram morrer por dentro. “Aquele que não ama, permanece na morte”. Decidir não mais amar é decidir enterrar-se vivo; é decidir espalhar o veneno da raiva, da mágoa e do ressentimento sobre todas as plantas do jardim da sua alma, até que ele se torne um lugar deserto, seco, morto.

“Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Como eu vos amei, assim também vós deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13,34). Antes de Jesus, já existia o mandamento do amor: amar a Deus sobre todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo. O que existe de novidade no mandamento de Jesus é amar como Ele nos amou: “Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o fim” (Jo 13,1). Amar até o fim é decidir continuar a amar depois que surgiu uma doença que impossibilitou a vida sexual no casamento; depois que a novidade deu lugar à rotina; depois que o corpo jovem e cheio de vigor entrou na fase do declínio e do envelhecimento; depois que a convivência com os defeitos da outra pessoa desmanchou a imagem idealizada que tínhamos dela.  

            O grande teste pelo qual o amor passa é a dor. Amar é expor-se à dor, é correr o risco de ferir-se, de não receber na mesma medida em que se dá. Amar como Jesus nos amou é aceitar ser crucificado para salvar aqueles que nós amamos. Em outras palavras, só é verdadeiro o amor que aceita sacrificar-se por aquele que ama. É aqui que a maioria fracassa. Nós não admitimos morrer em nosso egoísmo para que o amor não morra em nosso relacionamento com determinada pessoa. Nós não admitimos que, de fato, "é preciso que passemos por muitos sofrimentos para entrar no Reino de Deus" (At 14,22). Queremos experimentar o amor de Deus por nós, manifestado na cruz de seu Filho, sem com que tenhamos que ser crucificados em nosso egoísmo, em nossos caprichos, em nossa exigência de uma vida sem dor e de um amor que não precise sacrificar-se, que não precise sofrer para continuar a amar.

            Essa é a grande diferença entre nós e Jesus. Enquanto Jesus decide nos amar até o fim, aceitando morrer por nós numa cruz, nós tomamos a decisão de deixar de amar exatamente porque a cruz entrou em nossa vida. Queremos entrar no Reino de Deus desde que isso não nos custe sofrimento algum. Queremos colher flores no jardim da nossa existência sem que a semente que somos precise ser enterrada e morrer, para somente assim germinar e florescer. Nosso amor morre de fome, de desnutrição, porque somos grãos de trigo que não aceitam ser triturados para se tornarem a farinha da qual nascerá o pão que alimentará o amor que tanto desejamos que esteja presente em nossa vida.  

            Jesus afirmou: “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros” (Jo 13,35). As pessoas que não frequentam nossa Igreja, ou que não são cristãs, ou que não creem em Deus, veem amor em nós e entre nós? As pessoas que chegam em nossas celebrações são acolhidas com amor ou tratadas com indiferença? A forma como tratamos as pessoas no ambiente de trabalho e no dia a dia manifesta o amor de Deus por todo ser humano? Nós amamos somente aqueles que o mundo “ama”: os belos, os fortes, os “importantes”, ou escolhemos amar preferencialmente aqueles que são ignorados e tratados com indiferença pelo mundo: os doentes, os fracos, os idosos, os “sem importância”, os deficientes, os esquecidos?

            São João da Cruz dizia que “no entardecer da vida, seremos julgados a respeito do amor”. Quando a nossa vida terrena terminar e formos colocados diante do tribunal de Cristo (cf. 2Cor 5,10), Ele nos perguntará se nós amamos até o fim, se amamos os que ninguém quis amar, se nós perseveramos em nossa decisão de amar mesmo sendo crucificados por aqueles que a vida confiou ao nosso amor. Enfim, parafraseando Santa Teresa de Calcutá, tenhamos consciência de que “a maior doença hoje em dia não é o câncer, mas sim a solidão e a sensação de não ser amado”.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 8 de maio de 2025

A QUAIS MÃOS EU TENHO ME CONFIADO DIARIAMENTE?

 Missa do 4º dom. páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 13,14.43-52; Apocalipse 7,9.14b-17; João 10,27-30

 

            “Todos nós como ovelhas, andávamos errantes, seguindo cada qual o seu próprio caminho” (Is 53,6). Essas palavras do profeta Isaías retratam o mundo atual: uma humanidade que anda errante, que não sabe para onde vai. Além disso, o individualismo faz com que cada um siga seu próprio caminho, ou seja, sua própria desorientação, perdendo-se, machucando-se, e às vezes, destruindo-se com suas próprias mãos.

            A resposta que o Pai deu à necessidade que todo ser humano tem de orientação, ou seja, que cada ovelha tem de encontrar o seu Pastor, foi enviar seu Filho. De fato, Jesus, “ao ver a multidão teve compaixão dela, porque estava cansada e abatida como ovelhas sem pastor” (Mt 9,36). Jesus não apenas nos convidou a pedir ao Pai que envie pastores para cuidar do Seu rebanho (cf. Mt 9,38), mas ele mesmo abraçou a missão de ser um pastor segundo o coração de Deus (cf. Jr 3,15). Neste sentido, São Pedro afirma: “estáveis desgarrados como ovelhas, mas agora retornastes ao Pastor e guarda de vossas almas” (1Pd 2,25).

Na sua mensagem para este domingo, o Dia Mundial de Oração pelas Vocações, escrevendo enquanto estava internado no Hospital Gemelli, em Roma, o Papa Francisco nos lembrou de que a desorientação do mundo atual se traduz numa “crise de identidade que é uma crise de sentido e de valores, que a confusão digital torna ainda mais difícil de atravessar”. Infelizmente, é dentro dessa “confusão digital” que as novas gerações têm buscado respostas, afastando-se da voz de Jesus, cuja verdade do Evangelho nos salva da desorientação, e acolhendo como “verdade” a voz de “Tick Tokers”, “Youtubers” e “Influencers” digitais, os quais são apenas “cegos conduzindo cegos” (cf. Mt 15,14).

Ao revelar-se como único e verdadeiro Pastor, Jesus afirma: “As minhas ovelhas escutam a minha voz” (Jo 10,27). “Escutar”, no sentido bíblico, significa “obedecer”. Muitas pessoas se recusam a escutar a voz de Jesus que ressoa através da Igreja, para obedecer cegamente a voz dos “pastores” da mídia, ainda que sejam líderes religiosos católicos. Muitas dessas ovelhas se recusaram a ouvir a voz do Papa Francisco, porque suas palavras questionavam a ideologia política delas. Além disso, essas ovelhas escolheram viver sua fé separadas do rebanho de Cristo; se consideram católicas, mas não frequentam e não querem pertencer a nenhuma Paróquia. Não são apenas ovelhas sem pastor, mas também sem rebanho.

            Sendo rejeitado por muitos líderes religiosos, assim como o Papa Francisco foi rejeitado por católicos conservadores e tradicionalistas, Jesus sempre permaneceu sereno e confiante na sua missão, entendendo que todo ser humano é livre para escolher a quem seguir, por quem se orientar, e aqueles que rejeitaram sua Palavra não eram, verdadeiramente, “suas” ovelhas. Essa rejeição à palavra do Evangelho foi testemunhada por Paulo e Barnabé, no texto dos Atos que agora a pouco ouvimos: “Era preciso anunciar a palavra de Deus primeiro a vós. Mas, como a rejeitais e vos considerais indignos da vida eterna, sabei que vamos dirigir-nos aos pagãos. Porque esta é a ordem que o Senhor nos deu: ‘Eu te coloquei como luz para as nações, para que leves a salvação até os confins da terra’” (At 13,46-47).

            Qualquer pessoa tem o direito de recusar-se a obedecer à palavra de Jesus, anunciada pela Igreja através da pregação do Evangelho. O grande perigo, porém, é esta recusa torná-la indigna da vida eterna! Não podemos nos esquecer de que o próprio apóstolo Pedro afirmou a Jesus: “Senhor, a quem iremos? Tens palavras de vida eterna” (Jo 6,68). Recusar a pregação do Evangelho alegando ser esta uma palavra muito dura, questionadora e exigente, que denuncia o quanto o nosso modo de viver não está de acordo com a vontade de Deus, pode até nos deixar mais livres para seguirmos nossos próprios caminhos, nossas próprias desorientações, mas nos distanciará sempre mais da vida eterna.

Contrapondo-se à desorientação do mundo atual, Jesus afirma: “As minhas ovelhas escutam a minha voz... Eu dou-lhes a vida eterna e elas jamais se perderão” (Jo 10,27-28). A única forma de não nos perdemos na desorientação do mundo moderno é nos guiar pela voz de Jesus no Evangelho, voz que precisa não apenas ser ouvida por nossos ouvidos, mas, sobretudo, pelo nosso coração. Aqui são oportunas as palavras do Papa Francisco, na sua Mensagem para o dia de hoje: “O mundo, queridos jovens, vos induz a fazer escolhas precipitadas e a encher os dias de barulho, impedindo a experiência de um silêncio aberto a Deus, que fala ao coração. Tende a coragem de parar, de escutar dentro de vós e de perguntar a Deus o que Ele sonha para vós. O silêncio da oração é indispensável para ‘interpretar’ o chamado de Deus na própria história e para dar uma resposta livre e consciente”.

Depende unicamente de cada um de nós afastar-se do barulho, entrar no quarto do seu silêncio interior, para podermos ouvir a voz do nosso Pastor, cuja orientação nos tira da confusão e nos mostra o caminho para a vida eterna. Sem essa atitude nós seguimos pela vida como uma folha seca que o vento da desorientação empurra para onde quer. É na oração diária que voltamos a nos colocar nas mãos do Pai e do Filho: “Ninguém vai arrancá-las de minha mão. Meu Pai, que me deu estas ovelhas, é maior que todos, e ninguém pode arrebatá-las da mão do Pai” (Jo 10,29-30). Aqui é preciso ter consciência que somos nós que escolhemos em quais mãos nos colocar, a quais mãos nos confiar. Por mais que o ser humano moderno pense ser autônomo, ele sempre acaba por se confiar às mãos de algo ou de alguém. Nenhuma ovelha consegue sobreviver sem vincular-se a algo ou a alguém que se torne para ela seu pastor, seu segurança, seu protetor, sua orientação.

Em quais mãos eu me sinto neste momento? A quais mãos eu tenho me confiado? Às mãos do mercado? Às mãos de algum influenciador digital? Às mãos de algum lobo vestido com pele de pastor? Às mãos do meu próprio vício e do meu próprio pecado? Só experimenta proteção e só encontra vida quem escolhe permanecer nas mãos do Pai e do Filho, como revela o livro do Apocalipse: “Nunca mais terão fome, nem sede. Nem os molestará o sol, nem algum calor ardente. Porque o Cordeiro, que está no meio do trono, será o seu pastor e os conduzirá às fontes da água da vida. E Deus enxugará as lágrimas de seus olhos” (Ap 7,16-17).

           

Oração: Senhor Jesus, todos nós estamos vivendo num mundo profundamente desorientado, onde cegos estão guiando cegos, sobretudo nas redes sociais. Concede-nos escutar e obedecer à tua voz, pois só tu tens palavras de vida eterna! Retira-nos das mãos dos falsos pastores, das mãos da nossa própria desorientação e, sobretudo, das mãos do nosso vício e do nosso pecado. Que a nossa oração diária seja o momento em que nos confiamos às tuas mãos e às mãos do Pai, mãos que nos resgatam, nos curam, nos protegem e nos orientam no caminho para a vida eterna. Vós que com o Pai viveis reinais pelos séculos dos séculos. Amém.

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 1 de maio de 2025

DA DECISÃO DO ABANDONO PARA A DECISÃO EM VOLTAR PARA A MISSÃO QUE NOS FOI CONFIADA

 Missa do 3º dom. da Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 5,27b-32.40b-41; Apocalipse 5,11-14; João 20,1-14.

 

            Quando Jesus chamou seus dois primeiros discípulos, Simão Pedro e André, disse-lhes: “Sigam-me, e eu farei de vocês pescadores de homens” (Mt 4,19). “Pescar homens” significa resgatar pessoas de toda situação de morte, pois o mar, na Sagrada Escritura, representa as forças do mal que investem contra os seres humanos. Mas há algo estranho acontecendo no coração de Simão Pedro: “Eu vou pescar” (Jo 21,3). Ao que tudo indica, Pedro decidiu voltar à sua antiga vida de pescador de peixes. Por qual motivo? Apesar de já ter visto Cristo ressuscitado duas vezes (cf. Jo 20,19.26), Simão Pedro não sente a presença do Ressuscitado junto dele e da Igreja, representada aqui pelos sete discípulos. Portanto, a decisão de ir pescar peixes aponta para o abandono da missão de pescar homens.

            Essa decisão – “Eu vou pescar” (Jo 21,3) – tem sido tomada por muitos cristãos que, apesar de ouvirem a Igreja proclamar que Cristo ressuscitou, não o sentem junto a si, na luta cotidiana da vida. “Eu vou pescar” é o abandono do casamento e da família, é o dizer “pra mim, já deu!”, é o retorno à vida antiga, é a desistência de continuar a buscar a meta para a qual fomos chamados, é o voltar ao vício, ao pecado, a uma vida mundana, a uma vida segundo a carne (nosso egoísmo) e não mais segundo o Espírito (a vontade de Deus). Todos nós corremos esse risco de nos tornar pessimistas e desanimar da missão que nos foi confiada. O pior é que a nossa decisão de abandonar tudo acaba por arrastar outras pessoas conosco: “Também vamos contigo” (Jo 21,3).

            Qual foi o resultado da desistência dos discípulos em deixar de pescar homens e tentar pescar peixes novamente? O fracasso: “Saíram e entraram na barca, mas não pescaram nada naquela noite” (Jo 21,3). Quando abandonamos a missão que somos e nos distanciamos da verdade de Deus, a única coisa que conseguir colher é o fracasso. Por isso, quando não estamos pescando mais nada, precisamos nos perguntar se estamos fazendo aquilo que, de fato, fomos chamados a fazer; se, por acaso, não estamos no lugar errado, fazendo coisas erradas, desperdiçando nossas energias com coisas que nada têm a ver com a nossa verdadeira vocação. Neste sentido, o fracasso é a coisa mais importante que precisa surgir em nossa vida.

            A boa notícia é que a noite do fracasso termina com o amanhecer de um novo dia, e esse amanhecer nos remete para o momento em que foi anunciado à Igreja, por meio de Maria Madalena, que o Senhor Jesus ressuscitou (Jo 20,1.11ss)! “Já tinha amanhecido, e Jesus estava de pé na margem” (Jo 21,4). Jesus é a “Estrela da manhã” (Ap 2,28). O brilho do sol que nasce aponta para a luz da ressurreição que venceu as trevas da morte. Jesus está “de pé”, justamente porque ele é o Ressuscitado. “Mas os discípulos não sabiam que era Jesus” (Jo 21,4), seja porque estavam um pouco distantes da praia, seja porque o corpo de Jesus está agora glorificado, seja ainda porque, quando nossos olhos se fixam no resultado dos nossos fracassos, não conseguimos enxergar o Ressuscitado próximo de nós, quando é nele que os nossos olhos precisam se manter fixos (cf. Hb 12,2)!

            Mas finalmente chega o momento em que o Ressuscitado é reconhecido! Quando Jesus disse aos sete discípulos da barca: “Lançai a rede à direita da barca, e achareis”, eles obedeceram, lançaram a rede “e não conseguiam puxá-la para fora, por causa da quantidade de peixes. Então, o discípulo a quem Jesus amava disse a Pedro: ‘É o Senhor!’” (Jo 21,6-7). Notemos que o discípulo amado não diz a Pedro: “É Jesus!”, mas “É o Senhor!”. O título “Senhor” só foi dado a Jesus após a ressurreição (cf. Fl 2,9-11). Quando o discípulo amado reconhece o Ressuscitado, Pedro tem a estranha atitude de vestir sua roupa (pois estava nu) e atirar-se ao mar (cf. Jo 21,7). A nudez de Pedro simboliza o abandono da sua identidade de discípulo. Sentindo a ausência do Ressuscitado, ele havia abandonado a sua “veste de discípulo”. Agora que volta a enxergar o Ressuscitado, retoma a sua veste e mergulha no mar, porque deseja chegar ao Ressuscitado o mais rápido possível.

            Muitos cristãos decidiram ficar nus, para não serem reconhecidos como discípulos de Jesus, num mundo contrário ao Evangelho. Este terceiro domingo da Páscoa nos convida a retomar a nossa identidade de discípulos, a voltar para a missão que nos foi confiada, a não nos deixar levar pela correnteza, mas a nadar na direção do Cristo ressuscitado, aquele que nos chamou a abraçar a missão de pescar homens, de ajudar a resgatar pessoas do mar da destruição e da morte.  

“Logo que pisaram a terra, (os discípulos) viram brasas acesas, com peixe em cima, e pão... Jesus disse-lhes: ‘Vinde comer’” (Jo 21,10.12). Na última Ceia, Jesus tinha predito a traição de Judas e a negação de Pedro. Agora, nesta ceia improvisada na praia, o Ressuscitado oferece a Pedro a chance de rever suas atitudes anteriores e abraçar com mais convicção a sua missão de apascentar as ovelhas do Seu rebanho (vv.15-19), deixando-se orientar a cada dia por Sua palavra.   

            Retomando alguns pontos deste Evangelho... “Eu vou pescar” – Estou mantendo minha fidelidade à missão de “pescar pessoas” para Deus ou passei a fazer parte daqueles que abandonaram a missão? “Também vamos contigo” – Mesmo vendo tantos que abandonaram seu trabalho na Igreja, eu continuo perseverando, ou deixei me contaminar pelo pessimismo dos outros? “Não pescaram nada” – O que o fracasso que estou enfrentando está me dizendo? Estou onde deveria estar, fazendo o que me foi confiado, ou me distanciei da minha vocação original? “Já tinha amanhecido, e Jesus estava de pé na margem” – Eu confio que não existe noite que impeça o sol de surgir no amanhecer? Eu creio que Cristo está vivo e me oferece a sua Palavra no amanhecer de cada dia, para me orientar na missão? “Simão Pedro, ouvindo dizer que era o Senhor, vestiu sua roupa, pois estava nu, e atirou-se ao mar” – Eu também estou nu? Eu também prefiro não ser reconhecido como discípulo de Jesus, para não ser criticado ou agredido por um mundo contrário ao Evangelho? “Vinde comer” – Eu me deixo alimentar pela Eucaristia que o Ressuscitado me prepara e abraço esse momento como uma oportunidade de confirmar a minha vocação e missão de cuidar daquilo que Ele confiou aos meus cuidados?

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

quinta-feira, 24 de abril de 2025

A VERDADEIRA FÉ NÃO É CERTEZA, MAS CONFIANÇA, APESAR DA DÚVIDA

 Missa do 2º dom. Páscoa. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 5,12-16; Apocalipse 1,9-11a.12-13.17-19; João 20,19,31.

 

São Lucas nos apresenta um retrato da nossa Igreja no século I, por volta dos anos 80, após a ressurreição de Jesus e a vinda do Espírito Santo: “Crescia sempre mais o número dos que aderiam ao Senhor pela fé” (At 5,14). Essa afirmação contrasta com a crescente perda de fé das pessoas no mundo todo, de modo que a “religião” que mais cresce no mundo – também no Brasil, conforme o censo de 2022 – é a dos “sem religião”. Embora durante o pontificado do Papa Francisco o número de católicos que abandonam a nossa Igreja tenha caído pela metade em nosso País (conforme revelou o censo de 2022), continua a aumentar o número das pessoas que escolhem não ter nenhuma religião, e isso não apenas por desencanto com igrejas e religiões, mas, sobretudo por desencanto com o próprio Deus.  

Neste segundo domingo da Páscoa nos deparamos com a falta de fé de Tomé. Primeiro, ele não teve fé na palavra da Igreja, isto é, dos demais apóstolos, que lhe disseram: “Vimos o Senhor!” (Jo 20,25). Segundo, ele não teve fé na própria ressurreição de Jesus, a ponto de exigir uma experiência particular: “Se eu não vir a marca dos pregos em suas mãos, se eu não puser o dedo nas marcas dos pregos e não puser a mão no seu lado, não acreditarei” (Jo 20,25). Essa exigência de Tomé está presente hoje não só na necessidade de ver, mas também se sentir a presença de Deus. O mundo atual só crê no que vê e no que sente, reduzindo a fé a uma sensação, a uma emoção. Pregadores que levam os fiéis à emoção são os que mais têm suas igrejas e redes sociais lotadas de “seguidores”.  

Reduzir a fé a uma emoção tem dois problemas: primeiro, emoções passam, mudam e acabam rapidamente; segundo, nem Deus, nem a religião são uma espécie de droga fabricada para provocar emoção nas pessoas e mantê-las distantes da realidade que são chamadas a enfrentar. Como afirmou Davide Caldirola, “a verdadeira fé é aquela que nos salva nas tempestades e não das tempestades da vida”. Sempre que tentamos transformar Deus numa proteção que nos mantém blindados contra a vida, ou impedindo-nos de sermos feridos, machucados, Ele nos deixa falando sozinhos, até que a nossa fé desista de fabricar um deus à nossa imagem e semelhança e aceite a imagem do verdadeiro Deus: Cristo, o Ressuscitado que traz em seu corpo as marcas do Crucificado.  

Outro grande problema da nossa fé é o imediatismo, a incapacidade de esperar em Deus. Porque plantamos a semente da fé ontem, no chão da nossa vida, queremos colher hoje, nos esquecendo de que “a estação do milagre não é aquela da semeadura, nem a da colheita; é aquela da espera” (Davide Caldirola). Uma fé que não se desdobra em esperança não suporta as demoras de Deus. Uma fé que chora o tempo todo, desejando o leite das consolações de Deus, não é uma fé adulta, mas infantil, uma fé que não se mantém junto do Deus de toda a consolação, mesmo quando Ele não nos dá consolação alguma.   

Um engano muito comum, quando falamos de fé, é pensar que, se temos fé, não podemos duvidar. Na verdade, a fé verdadeira tem espaço para a dúvida. Muitas pessoas, por não suportarem os questionamentos do mundo, trocaram a fé pelo fundamentalismo. “O fundamentalismo é um distúrbio de uma fé que tenta entrincheirar-se no meio das sombras do passado, defendendo-se da perturbadora complexidade da vida” (Pe. Tomás Halík, A noite do confessor, p.35). São exatamente esses católicos fundamentalistas que rejeitaram o magistério do Papa Francisco e que comemoraram a sua morte, postando em suas redes sociais: “Já foi tarde!”.

Totalmente oposta ao fundamentalismo, a fé não é certeza, mas confiança. Eu não vejo, não sinto e não entendo o agir de Deus em minha vida; mesmo assim, eu confio no Seu agir. Neste sentido, devemos nos lembrar das palavras que um grupo de judeus deixou escritas numa pedra, na cidade de Colônia, Alemanha, durante a segunda guerra mundial: “Creio no Sol, mesmo quando não brilha; creio no Amor, mesmo quando não o sinto; creio em Deus, mesmo quando Ele se cala”. Isso é fé!

No momento em que Jerusalém estava sitiada por dois povos aliados contra ela, e o rei e o povo estavam tremendo de medo, Deus mandou Isaías dizer: “Se vocês não tiverem fé, não conseguirão manter-se firmes” (Is 7,9). É como se Deus dissesse: “Se vocês não se atreverem a se apoiar em mim, jamais poderão experimentar que são amparados”. A fé é exatamente isso: apoiar-me no Crucificado Ressuscitado, fundando sobre ele a minha vida e buscando, unicamente nele, estabilidade, segurança e perseverança. Que a nossa oração hoje seja a daquele pai, cuja falta de fé foi criticada por Jesus: “Eu creio, Senhor! Ajuda a minha falta de fé!” (Mc 9,24). Supliquemos, cantando: “Meus Deus, eu creio, adoro, espero e amo-vos. Peço-vos perdão para os que não creem, não adoram, não esperam e não vos amam!” (Oração do Anjo de Fátima).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi

sábado, 19 de abril de 2025

A RESSURREIÇÃO NOS HABITA COMO A VIDA DE UMA ÁRVORE ESCONDIDA DENTRO DE UMA SEMENTE

 Missa da Páscoa do Senhor. Palavra de Deus: Atos dos Apóstolos 34a.37-43; Colossenses 3,1-4; João 20,1-9.

          “Se Cristo não ressuscitou, vazia é a nossa fé” (1Cor 15,14). Dizendo de outra forma, se Cristo não tivesse ressuscitado, nós não teríamos razão alguma para crer em Deus; nossas perguntas não teriam resposta, nossas feridas não teriam cura, nossa fome e sede de justiça jamais seriam saciadas e nós nunca mais nos encontraríamos com os nossos entes queridos que já partiram desta vida terrena. Toda a nossa fé se sustenta unicamente no fato de que Cristo ressuscitou. Essa fé, por sua vez, tem como fundamento o testemunho dos apóstolos: “Deus o ressuscitou no terceiro dia, concedendo-lhe manifestar-se não a todo o povo, mas às testemunhas que Deus havia escolhido: a nós, que comemos e bebemos com Jesus, depois que ressuscitou dos mortos” (At 10,40-41).

Mas Jesus ressuscitou para que? “Cristo morreu e ressuscitou para ser o Senhor dos mortos e dos vivos” (Rm 14,9). Isso significa que Cristo é o Senhor de tudo o que em nós ainda está vivo e também de tudo o que já morreu em nós. Além disso, devemos saber que, “quer vivamos, quer morramos, pertencemos ao Senhor” (Rm 14,8). Não pertencemos à morte; não pertencemos a este mundo, no qual sofremos muitas tribulações, mas pertencemos àquele que venceu este mundo!  

Eis a razão pela qual nós hoje cantamos com o salmista: “Este é o dia que o Senhor fez para nós: alegremo-nos e nele exultemos!” (Sl 118,24). Jesus ressuscitou para que, não obstante as dificuldades que temos que enfrentar nesta vida terrena, nos alegremos e exultemos porque Ele, o Ressuscitado, está agora diante da face do Pai, dia e noite, intercedendo por nós (cf. Hb 9,24). “Este é o dia que o Senhor fez para nós” (Sl 118,24), dia que durará cinquenta dias, porque inaugura na Igreja o Tempo Pascal, o qual se encerrará com a festa de Pentecostes, Tempo no qual o Ressuscitado aparecerá aos seus discípulos, comprovando a sua ressurreição, e os preparará para receber o dom do Espírito Santo, garantia da nossa futura ressurreição (cf. Ef 1,13-14; 4,30; Rm 8,11).

Como somos chamados a viver neste Tempo Pascal? “Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres” (Cl 3,1-2). Sempre precisamos estar cientes de que vivemos num mundo que não olha para o alto, que reduz a fé em Deus a uma busca de felicidade somente aqui e agora, um mundo que não crê na recompensa por uma vida justa (cf. Sb 2,22). Mergulhados na luta pela sobrevivência e afastados da realidade social por meio da indústria da distração (canais de streaming, mundo digital e realidade virtual), nós facilmente perdemos o foco e esquecemos a meta a qual fomos chamados: aspirar às coisas celestes, desejar o céu, viver como cidadãos do céu e não como pessoas mundanas e terrenas.

Se é verdade que cada vez mais pessoas deixam de crer em Deus, em seu Filho ressuscitado e na Igreja, é porque muitos de nós, cristãos, vivemos como pagãos, buscando somente o que é terreno. E se nós mesmos não sentimos a presença do Ressuscitado junto a nós, esquecendo a sua promessa: “Eu estarei convosco todos os dias, até o fim dos tempos” (Mt 28,20), é porque também nos esquecemos de que a nossa vida de homens e mulheres destinados à ressurreição “está escondida com Cristo, em Deus” (Cl 3,3). O Espírito Santo, garantia da nossa ressurreição, habita em nós como a vida de uma árvore habita escondida dentro de uma semente. Não é apenas o mundo que não enxerga a ressurreição em nós; nós mesmos não a vemos, e muitas vezes não a sentimos pulsar dentro de nós. E isso acontece porque ainda não aceitamos esta verdade: “Não olhamos para as coisas que se veem, mas para as que não se veem; pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno” (2Cor 4,18). Só pode sentir a promessa da ressurreição em sua vida quem sabe que “caminhamos pela fé e não pela visão” (2Cor 5,7).

            O Evangelho nos indica o primeiro sinal da ressurreição de Jesus: o túmulo vazio. Ele está vazio porque Jesus derrotou a morte. Na verdade, a morte de Jesus esvaziou todos os túmulos, como ele mesmo afirma: “Eu sou o Vivente; estive morto, mas eis que estou vivo pelos séculos dos séculos e tenho comigo as chaves da morte e da região dos mortos” (citação livre de Ap 1,18). Neste Tempo Pascal, somos chamados a deixar Jesus esvaziar os nossos túmulos, a devolver vida ao que deixamos que morresse em nós, a amar a nossa vida escondida ao invés de sofrermos a angústia de não sermos reconhecidos pelo mundo, a deixar a Palavra do Ressuscitado aquecer o nosso coração (cf. Lc 24,32) devolvendo-lhe a chama da fé, e a comungar a sua presença real na Eucaristia, para que nossos olhos se abram (cf. Lc 24,31) e possamos dizer, como os apóstolos: “Verdadeiramente o Senhor ressuscitou!” (Lc 24,34).

 

Pe. Paulo Cezar Mazzi